Exmo. Sr. Prof. Dr. Antônio José dos Santos Peçanha, Vice-Reitor da Universidade Federal Fluminense, nesse ato representando o Magnífico Reitor, Prof. Cícero Mauro Fialho Rodrigues,

Exmos. Srs. e Sras Membros dos Conselhos Superiores,

Ilmas. Autoridades universitárias aqui presentes,

Prezados colegas que compõem a mesa,

Prezados colegas do corpo docente e alunos do corpo discente,

Funcionários da UFF,

Meus queridos amigos e minhas queridas amigas,

            Aventura e gratidão. Com apenas essas duas palavras - para mim, no entanto, poderosas - quero resumir o gradiente de emoções que me percorrem o peito e me atravessam o raciocínio, como sínteses semânticas de meus pensamentos e sentimentos.

            Aventura. Espantoso o périplo da condição humana ao longo de seu processo histórico. Eis o homem, habitante de um pequeno planeta chamado Terra, surgido há quatro bilhões e meio de anos, que, por sua vez, localiza-se dentro de um universo de cerca de 14 bilhões de outros anos. Envolto nessas cifras astronômicas, ele vai construindo o seu caminho civilizatório em apenas seis mil anos. Visando fornecer uma imagem condensada dessa vereda, proponho aos meus alunos, lendo o historiador J.M. Roberts, a imagem de um relógio histórico. Se a civilização começa a se formar há seis mil anos atrás, e concebendo-se cada século como um minuto, então toda a história civilizada terá  apenas 60 minutos. Nesse hipotético relógio, a cristandade terá pouco mais de 20 minutos, a América cinco. O fantástico mundo novo em que vivemos – resultante, em grande parte, das profundas transformações surgidas após a Segunda Revolução Industrial, em meados do século XIX – não terá mais do que um minuto e meio. Tudo, ou quase tudo que de material existe nessa sala – a começar pela resina de meus óculos, o quartz de meu relógio, a fibra sintética de meu terno, para não falar das próprias palavras que leio e que foram digitadas em um computador – tudo, ou quase tudo nesta sala, repito, é obra da revolução científica e tecnológica que se acelera durante e após a Segunda Guerra Mundial. Tudo, ou quase tudo nesta sala, terá, então, pouco mais de 30 segundos em nosso hipotético relógio. Percebidas de um outro ângulo, não foram menos espantosas as transformações sociais postas em marcha no decorrer dos últimos cinqüenta anos. Nesse período, tendo se modificado vertiginosamente os modos de produzir e trabalhar, em função da explosão cientifica e tecnológica em curso, essas repercutiram, de modo espetacular, na organização institucional e ideológica das sociedades contemporâneas, engendrando o surgimento de inéditos padrões de atitudes e comportamentos. Para um homem ou uma mulher que viveu esse minuto, as mudanças na vida humana terão sido infinitamente mais significativas do que todas as que ocorreram nos 59 minutos que o antecederam. É o tempo de minha geração.

Vivemos, breve e bravamente, sem podermos sequer desvendar o mistério de nossa própria gênese. Não sabemos porque os nossos pais são os nossos pais, nem nossos parentes, nossos parentes. Quando sobrevivemos, e temos a oportunidade de alcançar a idade adulta, dependendo das circunstâncias objetivas que nos cercam, vamos construindo a subjetividade de nossa psique. Marcados, cada um, pela maior ou menor curiosidade – esta característica tão peculiar quanto imprescindível à espécie humana – vamos, incansavelmente, construindo nossa própria versão do mundo em que vivemos. Buscamos identificar, desde o illo tempore, de que modo operaram e operam as forças organizadoras do universo, seja no plano da natureza física, seja no plano da natureza humana. Descobrimo-nos fazendo história, mas não nas condições que queremos ou elegemos, mas naquelas que, externa e coercitivamente à nossa vontade, vieram do passado. Assim, penosamente, constamos que “a tradição de todas as gerações mortas oprime, como um pesadelo, o cérebro dos vivos” No decorrer de nossa sempre mais ou menos breve biografia, de acordo com a relatividade de nossas possibilidades e necessidades, haveremos de tecer nossa própria teoria sobre nós e os outros, assim como tudo o que nos circunda. Assim, se não sabemos conceber o que havia antes da grande explosão que deu origem ao universo, podemos tentar compreendê-lo, visando domar a força da natureza em nosso próprio proveito. Se desconhecemos porque nascemos em tal momento  e tal lugar do processo histórico, podemos procurar saber as razões de sua formação e de seu desenvolvimento, não como mero exercício intelectual, mas como condição mesmo de sua transformação. Se não podemos, enfim, saber porque somos filhos de nossos pais, somos impelidos a tentar conhecê-los e aprender amá-los, até pela exigência egoística de também nos conhecer e amar a nós mesmos.

            Essa é, então, a grande aventura: o próprio ato de viver. Ela só é suplantada por um desafio ainda maior: o saber do viver. Foi na minha querida UFF, onde ingressei em agosto de 1970, que grande parte de minha aventura de vida se deu. Docendo discimus, ensinando, aprendemos, dizem os latinos. Lendo aqui, relendo ali, estudando acolá, me formando e me informando alhures. Preparando e dando aulas. Refletindo. Corrigindo provas e trabalhos. Participando e organizando seminários, conferências, simpósios. Conversando com colegas e alunos aqui no campus da UFF e nos das universidades, nacionais e estrangeiras onde, por dever de ofício, freqüentei. Fazendo pesquisas, testando hipóteses, sempre de olho nos céus da teoria. Foi assim, tal como vejo hoje, que fui, pouco a pouco, percorrendo meu incompleto périplo, tão fascinante quanto interminável, tão fatigante, quanto tonificante. O conhecimento, enquanto não verbalizado, e na medida em que não é organizado por escrito, é disperso, fragmentado, desorganizado. Só é conquistado a duras penas, por meio de aproximações e afastamentos sucessivos, intermitentemente, até a sua internalização. Somente aí, quando, por assim dizer, penetra os poros de nossa alma e espírito, é que ele permanece, tornando-se inextricável patrimônio de nós mesmos. No entanto, a aventura do conhecimento se move, rumo a regiões desconhecidas. O que vale hoje, pode não valer amanhã, o que se sabe agora, pode não ser mais válido depois. A aventura do conhecimento é sempre construída e reconstruída pelo espírito humano, com penosos mas compensadores esforços, nela residindo, talvez, a única fonte possível da eterna juventude. Eis porque, devido as minhas dúvidas, mais do que pelas minhas certezas, sinto-me mais jovem hoje do que ontem.

            A aventura do conhecimento me levou a amar cada vez mais meus pais através do exercício da compreensão. Permitiram aproximar-me mais dos meus irmãos e de toda minha família, gênese e transcendência imediata de mim mesmo no processo mágico da vida. Procurando conhecer-me melhor, alarguei o raio de abrangência dos meus afetos, compreendendo cada vez mais os amigos, porquanto, como no ensina o grande Cícero,no seu clássico ensaio sobre a amizade, “um amigo é  para nós um outro nós mesmos”. A disjuntiva hamletiana ser ou não ser – foi se desfazendo. Sou convicto democrata por desprezar a arrogância mesquinha das ditaduras. Tenho asco e nojo dos tiranos. Sou sincero socialista por saber que a ordem do capitalismo avilta a alma do homem, fazendo florescer destrutivo individualismo, senhor do consumo desenfreado. Vivemos em um mundo onde, se somarmos o que os americanos gastam, em um ano, com cosméticos, e os europeus com os sorvetes, em igual tempo, poder-se-ia garantir o ensino básico, o fornecimento da água e o saneamento elementar em todo o planeta. Como a maioria dos meus contemporâneos, não sei dizer como e quando será possível a materialização de uma sociedade planetária mais justa e mais fraterna. No entanto, basta-me saber, por enquanto, as causas eficientes e finais do que aí está, para ter forças para perseverar no bom caminho e no bom combate. Como disse Oscar Wilde, o mapa do mundo estaria incompleto se nele não houvesse lugar para a utopia.  Descobri-me profundamente brasileiro, na minha maneira de pensar e agir, sentir e fazer. Percebo-me enraizado nesse país chamado Brasil, onde o amálgama de muitos povos gerou um processo civilizatório de cor cósmica. Nele, sinto-me interlocutor atuante, embora irremediavelmente pedestre, no processo histórico que me cerca. Se novamente nascesse, pediria aos deuses que me fizessem voltar para aqui porque, como na música, aqui é o meu lugar. Todos esses seres que sou não se tornaram incompatíveis com a idéia de Deus que cultivo, intensamente, cada vez mais, como principio organizador de uma inteligência infinita e integradora, cujas leis e propriedades, incessantemente, queremos descobrir. É que a ciência é humana, como conhecimento; mas sua enteléquia é divina, como mistério. Na minha viagem de aventuras, penso ter compreendido que somos quase sempre apenas pálidos portadores dessa inteligência superior, mas que também, muitas vezes, quando trabalhamos duramente, nos é permitido desfrutar os reflexos da luminosidade transcendental de Deus.   

Gratidão. Ensinou-me uma mulher, que foi muito importante na minha vida, que a gratidão não é um dever, mas uma das virtudes mais elevadas e sublimes da alma humana.  Gratidão é o reconhecimento, na dialética do um com o outro, de que o que somos, e vamos seguindo a ser, depende em parte substancial daquilo que nos foi oferecido por outrem a nós mesmos. Trata-se de uma doação que pode ter aspectos materiais, certo, mas que é, antes de tudo, de natureza espiritual. O que recebemos de mais importante na vida – solidariedade, carinho, compreensão situa-se no plano das virtudes do espírito humano e não se submetem às chamadas regras do novo Leviatã de nossos tempos, o pretenso e tão poderoso mercado. Sim, gratidão: fonte, terreno, marco, horizonte e/ou dimensão.

Fonte. Tive a sorte de ser filho de meus pais. Ele, José de Lima Figueiredo, general do exército brasileiro, engenheiro, homem de letras com 15 livros publicados, jornalista, ghost writer do Presidente da República, jornalista, deputado federal e que, nessa função, foi o autor do parecer que fundamentou a criação da Petrobrás. Ela, D. Tercília, a incrível D. Pequenina, como a chamavam ternamente seus parentes e amigos mais próximos. Seu carinhoso apelido era o antônimo de sua fascinante personalidade. Meu pai, possivelmente, legou-me a genética de seu temperamento mas pouco pude desfrutar de sua convivência, já que ele se foi quando eu tinha apenas 15 anos. Fez-me muita falta, e a saudade que dele sinto me acompanhará sempre. No entanto, devo a minha mãe a formação do caráter. Foi ela a minha mais importante professora. Com ela aprendi a valorizar as amizades sem preconceitos, a persistir na insistência dos afetos conquistados, perseverar no zelo dedicado às amizades. Sim, ela era responsável por aqueles que adentravam em seu coração. Separada de meu pai depois de 24 anos de casamento, amou-o até o fim de sua vida, jamais retirando de seus dedos a aliança que eles trocaram entre si. A lição me foi decisiva: o amor é doação, não exige contrapartidas, nem condições e, quando existe, é para sempre. Fico a pensar como estará ela nesse momento, habitante transcendental dos páramos de onde ninguém volta, vendo seu filho, péssimo estudante quando garoto, contumaz gazeteiro nessa época, receber a honraria que hoje lhe entregam!

Terreno: meus irmãos. Diva, Ruth, Avany, José Rubens, e sua mulher Luzia, Ney, e sua mulher Rosely, são o solo firme onde, quando preciso, encontro apoio e busco forças para seguir na luta.  Sendo o último a nascer, tive a sorte e a oportunidade de poder aproveitar-me das boas lições de cada um deles, tão diferentes entre si, como costumam ser os irmãos, não obstante o mesmo pai e a mesma mãe. Devo a cada um e a todos – à emotividade da Diva, à flegma da Ruth, à piedade da Avany, à bondade do Rubens, à determinação do Ney – muito do que hoje sou. Mas todos eles sabem como um deles, a Avany, foi durante toda a minha vida, principalmente quando mais precisei, a amiga de todas as horas, arcanjo que por mim velou e protegeu quando fui tomado pelas pontas-pé da sorte, perplexo e desorientado nos sofrimentos de uma grave doença.  E sabem todos eles também como Ney, ao morrer nosso pai, com apenas 22 anos, resolutamente tomou o comando da família, velando, sem descansos, indômito, pela sua solidária união. Exigente, incentivou-me, sempre, a buscar o melhor; paternal, nunca deixou de ficar ao meu lado, não medindo esforços para me proteger dos duros golpes da vida. Fico também a pensar, sendo caçula, como eles, que me ensinaram tanto, quando eu nada sabia, devem estar se sentindo agora com o pomposo título que agora está me sendo concedido... porquanto, será que o irmão mais moço deles sabe mesmo alguma coisa? E ainda mais de modo notório? Se for assim, eu lhes diria que as suas dúvidas são também minhas...

        Marco: amizades. Se meus irmãos ofertaram-me a fraternidade imediata e sanguínea, os amigos me ofereceram a fraternidade da alma e do espírito.  Quando perdido, oriento-me por eles; quando enfraquecido, fortaleço-me com eles; desabrigado, são eles que me acolhem. Quem os têm, sabe: a mútua doação entre amigos fortalece a ambos, já que um, transferindo sua força para o outro, multiplica por dois a potência e a realidade de cada individualidade. Se o fundamento do conhecimento sofrido e vivido é a angústia, como na fórmula de Kierkekaard, são os momentos de dificuldade, e não os de facilidade, o cimento existencial das amizades verdadeiras. Homem pobre materialmente como sou, sinto-me rico pelas oportunidades que tive e tenho de ter conhecido e estar conhecendo pessoas de várias idades, sexo, nacionalidades, ideologias, origens étnicas e orientações religiosas que me engrandeceram com suas amizades. Não posso citá-los aqui, sob pena de cometer lapsos injustos. Mas posso lembrar os que já se foram, deixando como herança o legado de suas excelsas qualidades.  Aluizio Victor Carneiro, José Nilo Tavares, Eduardo Mascarenhas, Sérgio Lemos, José D”Albergaria, César França, René Dreifuss, Ari Vasconcelos. Juntaram-se ele ao Gal. Otávio Alves Velho que, principalmente nas crises de minha adolescência, ofertou-me inestimável consolo e compreensão, permanecendo meu amigo até seu momento derradeiro. No bom sonho vejo-os todos, nos jardins de Epicuro,  à  mesa de Manuel Mandelblatt, um dos homens mais bondosos que pude encontrar, avô materno de meus filhos  e que, em vida, me deu o título de seu melhor amigo. A ida deles me ensinou, entre outras lições, que a morte existe para que se possa pensar na vida. E que a verdadeira amizade não termina com o desenlace de um dos amigos. Só se extingue, não interessando quem seja o primeiro,  quando ambos terminam sua experiência terrestre. Sim, eu não sei o que teria sido de mim – pobre de mim! – sem meus amigos.

            Horizonte: filhos, Cláudio, Leonardo e Deborah. Penso que, se para as mulheres, os filhos são extensões objetivas de suas inatas biologias e psicologias, para nós homens eles são realidades vividas e construídas. Os homens são passivos no início da gestação; são suas mulheres quem lhes comunicam o que com elas acontece. Daí em diante ele é o espectador do milagre da vida; a mãe, o seu sujeito. O nascimento de meu primeiro filho, Cláudio, foi o momento mais empolgante, emocionante, e marcante de toda a minha existência até então. Uma experiência total, física e espiritualmente, que teria a felicidade de repetir quando vieram à luz Leonardo e, muitos anos depois, Deborah. A vinda dos filhos processa, em nós homens, uma revolução no ser e no pensar, no agir e sentir. O que éramos antes, não será mais da mesma maneira depois, porque eles, os filhos alargarm a ação da experiência sentida e sofrida; passam a personificar nossos melhores anseios, nossas melhores esperanças Na verdade, tudo o que faço de bom e justo é pensando neles; tudo o que almejo, afinal, é ser amado por eles, considerado por eles, reconhecido por eles. Eles me fornecem o horizonte do que fui e pretendo ser e me dão, assim, a dimensão da vida. E, por tudo isso, sou imensamente grato: pela força que eles acrescentam à minha vontade de viver. Quis o bom destino que Leonardo, tendo se casado com Daniela, e Cláudio de casamento marcado com Alessandra, que eu fosse agraciado com mais duas filhas, ambas igualmente lindas por fora e, melhor ainda, por dentro! Ocupam hoje lugar privilegiado em meu pobre e congestionado coração. Mas não poderia falar do amor que sinto pelos meus filhos, sem fazer referência à mãe deles, Janete Mandelblatt. Professora universitária, portadora de brilhante currículo, Janete é uma mãe de excelsas qualidades, tal como, aliás, costumam ser as de origem como a dela, judaica. Tendo, com a nossa separação, ficado com a guarda de meu maior patrimônio, meus filhos, ela merece toda a minha gratidão por tudo que eles são hoje e, tenho certeza, serão mais ainda depois. Minha gratidão seria incompleta, entretanto, se não acrescentasse que ela ostenta inexcedível mérito: aturou-me por 17 longos anos, logo eu, personalidade tão incompleta e paradoxal como sou.

Pronto. Creio não haver mais o hiato entre as palavras, aventura e gratidão. Fecha-se o poço. Elas se entrelaçam. Interfecundam-se. Não poderia ter chegado até aqui na minha venturosa aventura, se não tivesse contado com o afeto, o carinho, o amor de meus pais, irmãos, família, amigos e filhos. Sem eles, não teria suportado a tormenta da vida, em seus momentos de dor e inclemência. Não teria conseguido aturar a arrogância dos déspotas, as afrontas dos invejosos, a infâmia dos covardes, os golpes duros que o destino incerto assesta em cada um de nós. Não teria podido tolerar o pontapé dos arrogantes, a insensibilidade da soberba, as traições e deslealdades dos frustrados de toda sorte. Não teria podido enfrentar os momentos de doença, do corpo, da alma e do coração. Não teria conseguido vencer as torturas do amor não correspondido. Não teria tido forças para cair e levantar, cair e levantar, e tentar novamente, até o desenlace da cortina final. Sem eles minha aventura de vida teria parado em algum lugar do caminho, teria ficado em qualquer lugar desconhecido, como um inútil pedaço de pau, seco e murcho.  

            Preciso, agora, fazer alguns necessários agradecimentos, citando-os tendo em vista não a ordem de importância, mas a necessidade de nomeá-los. O Pró-Reitor de Pesquisa e Pós-Graduação da Graduação da UFF, Prof. Dr. Sidney Luiz de Mattos Melo; os meus colegas de Departamento, professores doutores Ari de  Abreu Silva, Cláudio de Farias Augusto, Gisálio Cerqueira Filho, Luis Manoel Fernandes e Renato de Andrade Lessa; o professor Dr. Francisco Palharini, Diretor do Instituto de Ciências Humanas e Filosofia; o professor Dr.Humberto Machado Fernandes, Diretor do Centro de Estudos Gerais, cada um deles, em fases diferentes do processo que levou à outorga do honroso título que ora recebo, foram magnânimos em suas opiniões a apoiaram, sem rebuços, a proposta de concessão. Embora esteja muito grato a todos igualmente, não posso deixar de ressaltar os nomes de Gisálio Cerqueira Filho e Renato Lessa. O primeiro, além de ter tido a idéia de incentivar a moção, foi quem, em nome de seus colegas, a redigiu e encaminhou à plenária departamental, com a autoridade intelectual que conquistou durante sua trajetória acadêmica, além da grandeza de atitudes que lhe é peculiar. O segundo, na qualidade de Professor Titular de Ciência Política da UFF, prontamente aceitou ser o relator do processo, acabando por produzir um parecer que constará como um dos documentos mais importantes relativos à minha vida profissional, seja pela elegância de sua escrita, seja pelo brilhantismo de sua formulação. Sabendo da dedicação que todos eles devotam a nossa universidade, talvez a melhor maneira de agradecer-lhes seja dizer que não entendo a concessão do titulo de notório saber como uma mera honraria. Compreendo a homenagem como mais um chamado de meus pares para participar mais, lutar mais, contribuir mais. Digo-lhes, assim, que pretendo, até os limites de minhas forças, continuar prestando meus serviços à nossa querida UFF. Sei bem, como cientista político que sou, que os compromissos são meras palavras quando não encontram o respaldo das ações concretas. Desde julho do ano passado poderia ter solicitado minha aposentadoria na UFF. Não usei esse direito, mesmo sabendo que me arriscaria a sofrer as conseqüências da nova legislação que passou a reger a previdência social em nosso país, tão danosa aos legítimos e adquiridos interesses dos servidores públicos. Por outro lado, em 19 de dezembro de 2002, o Exmo. Sr. Ministro do Estado da Justiça considerou-me anistiado político e determinou minha reintegração aos quadros docentes da UFRJ. Poderia, então, ter optado por me aposentar na UFF e, em dedicação exclusiva, voltar aos quadros docentes da UFRJ. Nessa instituição teria, inclusive, o direito de reivindicar, como me autorizam dizer suas autoridades universitárias, a posição de Professor Titular.  Em pouco tempo, também na UFRJ, estaria apto a requerer, também, minha aposentadoria plena nesse alto posto. Somando-se os dois benefícios, após 35 anos de ininterrupto exercício de minha profissão, poderia escolher uma vida mais tranqüila, sem submissão às rotinas de praxe. Ficaria a meu critério, quando e se quisesse, decidir-me por novos rumos.  Após longa e penosa reflexão, descartei, igualmente, ambas essas possibilidades, ciente das perdas materiais decorrentes de minha decisão. Todavia, a renúncia a essas alternativas acabou por fortalecer-me. Revigorou-me a têmpera. Fortaleceu-me o espírito. Deu-me garra, força e vontade. Fez-se um milagre no tempo: sinto-me hoje mais jovem do que há 15 anos atrás. Sinto-me pronto e disposto para a enfrentar o novo desafio que me propuseram. Em 12 de dezembro de 2003, o Magnífico Reitor designou-me Coordenador Executivo do Núcleo de Estudos Estratégicos da UFF. Encomendei a um querido aluno estudos visando a criação de um brasão que deverá servir como inspiração para nossos trabalhos, nele determinando que fosse escrito a equação que criei: sapientia potentia est, o saber é poder. Eis aí então, a chave de meu compromisso solene não só com vocês, meus queridos colegas que resolveram me honrar com o título que agora recebo, mas também com a minha querida UFF. Será à frente do Núcleo de Estudos Estratégicos, depois de três mandatos consecutivos como Chefe do Departamento de Ciência Política, que irei dedicar todas as minhas forças e energias para dar início a uma nova etapa de minha vida. Lá procurarei contribuir, irmanado com outros colegas de várias áreas do saber, para o estudo das alternativas que podem ser oferecidas ao nosso grande e sofrido Brasil. Não será, bem sei, uma tarefa fácil. Nossas elites, criadoras e criaturas de uma ideologia de submissão nacional, nunca, na verdade, puseram em prática um projeto coerente e auto-sustentado de educação, ciência e tecnologia voltado para nossa real independência e soberania. Contribuir para que isso mude, ou pelo menos comece a mudar, -eis aí os contornos do bom combate porque, tal como não desconhecem os grandes povos no concerto das nações, saber é, sim, a base do poder. Os desafios, repito, não me farão desanimar na busca dos objetivos. Afinal, como nos versos da bela canção, tenho novamente um coração de estudante, cheio de força, juventude e fé...

Finalmente, gostaria de pedir licença a todos e em especial aos meus queridos filhos, Cláudio e Leonardo, que sei serem adeptos das regras da boa galanteria, como bons cavalheiros que são, para dedicar a homenagem que agora recebo a uma pessoa muito especial para mim. Refiro-me a minha querida filha Deborah, cuja estética da aparência só encontra rival na ética de sua essência. Nos seus 15 anos, ela deve ter sérios motivos para desconfiar desses pretensos saberes de seu pai e, ainda mais, de sua notoriedade. Se for assim, mantendo o savoir faire, seu pai lhe dirá que ele também não encontra muitas razões para dela discordar...

Muito obrigado.

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